6.9.17

Fátima e Itália

 

Fomos a Fátima. Queria ir há tanto tempo, pedir por ela, agradecer por nós, que não pensei no papa, não pensei no 13 de Maio, nem nos outros 13. Não considerei as festas de anos, os casamentos da família, os fins-de-semana com miúdos, as aulas ou mesmo os exames. E não deu num, nem noutro, os meses foram passando e quando conseguimos ir era já Agosto. Comprámos a estadia no Inverno e só fomos no Verão, e entretanto a vida aconteceu e eu já só agradeci. Visitei Fátima como nunca tinha visitado. Acendemos velas, rezei mas também passeámos de mãos dadas e coração cheio. A Constança dormiu mal em Fátima mas comeu bem e andou sempre bem disposta. Não se pode ter tudo. Houve procissão das velas, como em todos os Sábados de Agosto. Ficámos num hotel de frente para o Santuário e a meio da noite já depois de terminada a procissão, ela ficou com ele e eu fui buscar água à fonte. Estavam jovens raparigas a rezar na capelinha das Aparições. Pessoas ainda pagavam promessas de joelhos. Estava tudo calmo e a noite estava estrelada e ali me sentei a rezar em paz, numa paz tão grande e avassaladora que me comovi. Enfim a Fé.

Recordei então este sentimento tão difícil de descrever e a primeira vez que o senti. Tinha 14 anos quando fui a Itália, descrente no meio de uma comunidade de adolescentes católicos praticantes, freiras e padres. Foram 15 dias de viagem por várias cidades de Itália, num autocarro muito grande. Dormíamos em colégios de freiras, conventos e uma vez num parque de campismo. Estávamos organizados por grupos, uns limpavam o autocarro, outros colocavam a mesa, outros cozinhavam (os mais velhos acho) e serviam as refeições. Dormíamos em sacos de cama, tomávamos às vezes banho de mangueira. Eu achava que já sabia tudo, fumava imenso, era desafiadora e atrevida. Foi uma viagem de muitas descobertas mas a maior de todas elas foi a da minha Fé.

O grupo cantava e alguns tocavam viola. Eram amigos, bondosos e brincalhões. Tinham o coração cheio de dádiva. Ainda recordo imensas canções «Guiado pela mão com Jesus eu vou, e sigo como ovelha que encontrou pastor, guiado pela mão com Jesus eu vou, aonde ele vai....». Também se rezava o Terço no autocarro e essa parte custava-me um bocadinho confesso. Havia também um correio do amigo secreto para trocarmos mensagens. Arranjámos ali uma família, uns eram pais e outros irmãos. O meu pai adoptivo era o Pedro e durante anos mantivemos contato. Acho que esteve presente na festa do meu 18º aniversário. Também tive um Crush de Verão que durou um pouco mais do que as férias, o Flávio, que para além de ter imensa graça também escrevia poesia. E uma amiga inseparável de viagem, a Rita. Uma vez tentámos fazer capuccino em pó com a água morna da torneira e não correu lá muito bem. Lembro com carinho o ritual de ir falar à noite, ler um texto, agradecer. Eu fugia sempre dessa parte envergonhada mas um dia apanharam-me já de pijama e não me safei. Porém o dia que tudo fez mais sentido para mim foi quando dormimos numa pousada nos arredores de Assis, por onde vivera São Francisco de Assis, uma casa simples com quartos cheios de camas confortáveis que acolhiam quem os visitava, no meio de um género de floresta, com uma vista linda. A religião assim fez sentido para mim, despojada e frugal. Recordo os agradecimentos dessa noite, como tudo me tocou e comoveu.

Voltando a Fátima sinto que os momentos de bondade absoluta e inocência são cada vez mais raros. O cinismo que vivemos hoje em relação a tantas coisas cria em nós uma couraça difícil de transpor. Já nos esquecemos como é tão mais fácil amar sempre. Os miúdos é que sempre nos desarmam, é neles que sinto a Fé renascer todos os dias. Num beijinho que cura tudo, num colinho bom, num «amo-te mamã» sem esperar retorno, é neste amor incondicional, crente e inocente, sem segundas intenções (às vezes também têm). O amor dos crescidos é muito mais complexo, único porém complexo. E o melhor que podemos dar-lhes é calma para que vivam em Paz, alegria para que possam ser felizes pelo exemplo, gratidão, esperança e fé para que sejam optimistas e gratos, valorizando sempre o que têm e dar de nós para que cresçam altruístas e bondosos. Afinal de contas um coração bom é muito difícil de corromper.

4.9.17

As férias do Algarve



Antes de estarmos juntos não fazia férias no Algarve. Fui um ou outro Verão com amigos mas agora é uma paragem obrigatória. O Carlos nasceu em Paris mas é de Faro, é lá que estão irmã e pais e restante família e foi assim que já crescida passei a passar parte das minhas férias lá. A casa dos pais do Carlos tem muitas flores, frutas, uma horta, um cão e um tanque. Está sempre calor e apesar da ventoinha no quarto permanecer ligada passo sempre mal as primeiras noites até me habituar.

O peixeiro e o padeiro passam por lá todos os dias e sente-se a qualidade de vida. Associo às nossas férias as praias de conchas, extenso areal e água transparente. É um castigo arrancá-los de casa, que estão sempre bem por ali, mas depois adoram sempre ir até à praia. Associo as nossas férias também à ilha de Faro e às bolas de Berlim (até a Constança já é fã) e de Alfarroba, ao mar mais quente e à bandeira verde. Também me lembra as torradas no pão do Algarve que os miúdos adoram (e nós também) e o chá de Bela Luísa à noitinha que apanhamos da árvore directamente para a chaleira. E ainda os figos; as laranjas; as cebolas; os tomates e os pêssegos do pai do Carlos. O Algarve recorda-me ainda os almoços de sardinhas e os jantares animados na mesa lá de fora mas também as noites de cartas e de idas ao Forum.

Para mim o Algarve pressupõe também uma visita a Olhão. O Carlos veste a camisola e prefere Faro mas eu adoro Olhão e passear na marginal perto dos hotéis, do mercado e dos restaurantes de peixe e marisco. Os meus pais ficaram lá quando vieram conhecer os pais do Carlos quando eu já estava grávida dela e é uma memória feliz e especial. Foi lá que apanhámos o barco para visitar a Armona e que me apaixonei por uma loja de antiguidades. Mas é também em Olhão que fica a conserveira Maná que visito religiosamente desde a primeira vez que lá fui. Nas últimas férias consegui trazer pela primeira vez Muxama a que fiquei completamente rendida. Está sempre esgotada quando lá vou. É um atum seco com a mesma receita que fenícios e romanos faziam à dois mil anos atrás e cujo sabor e textura fazem lembrar presunto. Para mim Olhão ficou igualmente associado ao Festival do Marisco ao qual fomos com os miúdos no dia em que tocaram os Dama.

Este ano fomos para o Algarve pela primeira vez com a lotação esgotada e um anexo em cima do carro para caber tudo. Uma verdadeira aventura!

O Afonso queria muito ir a Espanha e fomos passar um dia a Lepe e Inslantilla. Foi muito engraçado, a praia era muito boa e água ainda mais quentinha. A comida foi diferente e ainda demos um pulinho a um Mercadona e trouxemos algumas compras baratíssimas (não foram caramelos mas foi dentro do mesmo género): champôs; cremes; presunto; chocos e salgados.

Num outro dia demos um saltinho a Lagos e fomos visitar a Joana, uma amiga que fiz há uns anos valentes virtualmente, cheia de talento para as artes, escrita e artes performativas e que se tornou nossa cliente. A sua loja é do mais querido que há com imensos brinquedos, livros e jogos para todas as idades e para todos os gostos. Tem depois uma zona de brincadeiras onde a Joana lê com imensa graça histórias enquanto o marido toca viola. No Até à Lua há ainda um espaço com mesas para os ateliers e uma árvore gigante onde os meninos mais pequeninos podem entrar e brincar. Lá há sempre actividades giras: música; fantoches; histórias e noites de jogos. Foi um dia especial e muito engraçado.

É fácil apaixonarmos-nos pelo Algarve. A vida lá parece correr um pouco mais devagar. Lá é quase sempre Verão, são quase sempre férias e até as laranjas são mais doces. O artesanato é encantador, como o candeeiro/chaminé que trouxemos este ano para o anexo. Os sítios típicos como o Café Aliança, que reabriu em 2016, são pitorescos e charmosos mas as praias mais e menos desertas são as verdadeiras jóias deste lugar.

O Algarve não fazia mas faz já parte da minha vida e das nossas férias em família e é bom saber que há uns avós e uma tia do Algarve sempre de braços abertos para nos receber.