25.4.12

25 de Abril aos meus olhos


O Afonso passou os últimos dias a perguntar «Mamã já é 25 de Abril? Já posso colar os autocolantes? Já posso mamã?» e ontem foi para ele o dia, ou melhor a noite. Acompanhou-me ao jantar do partido e, ainda sem grande consciência democrática, participou pela primeira vez naquilo que é, não apenas uma liberdade, mas também um dever cívico. 

Cresci com pais que me mostraram o valor da liberdade, do poder falar, pensar e escolher. Um pai que  criou um partido político, que fazia reuniões no café Império, que tinha barba e gola alta e calças à boca de sino. Sou igualmente filha de uma mãe que tinha um pai que era tipógrafo e que por isso tinha acesso a livros que não passavam pelo crivo da PIDE, e que muitas vezes por causa dos «bufos» queimou documentos na sanita. Cresci também a ouvir falar de coisas menos doces como os desaparecidos, os presos políticos e o Tarrafal. 

Quando a Visão esta semana, provocadora, perguntou se deveria haver um novo 25 de Abril, foram raras as personalidades quer de esquerda e quer de direita a responder «Sim». A opinião comum é a de que a democracia, ainda que fragilizada pela crise, está bem instituída. A preocupação que se repete é a de que sejam postos em causa os direitos que tanto lutámos por adquirir. 

Do jantar ressalta o espírito inflamado e nostálgico de quem viveu esses tempos, a esperança dos mais jovens de que venham dias melhores e a crença de que é desta união, deste espírito e vivência colectivos que poderá nascer a força para enfrentar seja o que for. 

Para o Afonso fica a mensagem que devemos pensar, acreditar e agir, ao invés de apenas criticar. É possível e importante ser politicamente activo, independentemente da ideologia com a qual nos identifiquemos. 

Os Putos

Uma bola de pano, num charco
Um sorriso traquina, um chuto
Na ladeira a correr, um arco
O céu no olhar, dum puto.
Uma fisga que atira a esperança
Um pardal de calções, astuto
E a força de ser criança
Contra a força dum chui, que é bruto.
Parecem bandos de pardais à solta
Os putos, os putos
São como índios, capitães da malta
Os putos, os putos
Mas quando a tarde cai
Vai-se a revolta
Sentam-se ao colo do pai
É a ternura que volta
E ouvem-no a falar do homem novo
São os putos deste povo
A aprenderem a ser homens.
As caricas brilhando na mão
A vontade que salta ao eixo
Um puto que diz que não
Se a porrada vier não deixo
Um berlinde abafado na escola
Um pião na algibeira sem cor
Um puto que pede esmola
Porque a fome lhe abafa a dor.

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